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O caso da Armucela

 A Armucela é um lugar da freguesia de São Pedro de Borrifães (Borrifáns) que tem esta estrutura:





Poderia ser o caso de um cousso evolucionado, de morte a captura em vivo.


Esta ideia a apresentar sobre a origem da Armucela já apareceu em distintos escritos de este blogue, onde foram tratados topónimos do grupo armentum, ermida ....

O deus Hermes é decodificado como o *h₂ermn̥-ez "o do lugar da reunião, o reunidor", neste caso do gado, daí a lenda do roubo de gado e a condição de pastor da tal divindade.

Topónimos relevantes como Armental ou Hermida / Ermida (onde não há memória nem restos de ermida cristã nenhuma) são descifrados aqui referenciados ao cousso. Assim:

Hermida é pensado ter a origem no grego ἐρημίτης (erēmítēs) com raiz em ἐρῆμος (erêmos) "soidade".
E alguns lugares de esta toponímia apresentam indubitavelmente uma construção religiosa.
Nalguns casos de toponímia Hermida / Ermida, sem capela cristã ou restos dela, aparece a estrutura de um cousso, mais teria a ver com a ideia de hermético, fechado, com base na raiz que gera no grego antigo  ἕρμα (hérma), “pilha, montão de pedras, milhadoiro; coluna, piar”.
Daí que  ἕρμα (herma) inicialmente um amilhadoiro (ἑρμαῖα o ἑρμεῖα, ἑρμαῖοι λόφοι e ἕρμακες) para depois ser um piar, um marco com cabeça do deus mentado, Hermes, e com genitais masculinos no fuste.

Amilhadoiro no beco oeste de uma possível estrutura de captura, caça, em Teixidelo de Régua (Cedeira).

Assim alguns topónimos de base ermo ou hermo teriam a ver com antigos locais de caça, que antes de pensar somente num eremitório religioso cristão, que também, poderiam ter a ver com a raiz que gerou em ambivalência hermético e armentio.

Armucela, teria a raiz no mesmo que gerou no latim armentum "rebanho de vacas".
A etimologia protoindo-europeia proposta para armentum seria a união dos lexemas *h₂er- + *-mn̥ + *-teh₂.
Onde *h₂er- teria o significado de unir; *-mn̥ daria a ideia de ação; este lexema protoindo-europeu ou mesmo anterior: *-mn̥, daria no grego -μα, no latim -mentum, no galês -ma  "lugar, estado ou ação", no galego talvez o sufixo átono -mo (êdramo, lêgamo...,) como lugar ou como aumentativo; nas línguas fino-permianas (urálicas) da que procede o sámi *-men com a ideia de lugar; segundo isto descodificado desde o galego topónimos de base ermo / hermo seriam "o lugar do her-, er-, lugar da reunião".
Já o lexema final de *h₂ermn̥teh₂: *-teh₂: indicaria um estado de ser.

Então armentum poderia ser descodificado como "aquilo que está no lugar onde acontece a reunião".

Segundo isto: Armucela poderia ser decodificada como *h₂er- + *-mn̥ + *-keh₂ e um diminutivo -ela, "aquilo que é pertencente ao lugar de reunião".



A hipótese sobre a Armucela seria que uma construção, inicialmente para caça, teria sido transformada com um grande curro para animais em semi-domesticação num dos seus becos.

Sobre Pardinheiro:
Pardo poderia estar a dar nome à cor, e dai nomear o animal tabuado.
Pardo tem uma etimologia protoindo-europeia que o relaciona com o nome do leopardo em línguas da Índia e Pérsia. No persa پارس  (pârs) é o nome do guepardo treinado "domesticado" para a caça. Confronte-se com o francês pard "lince" e com o galego pardinho "lobo".

O caso do pio-pardo ou bios-bardos, como gambuzino, animal fantástico a caçar, pode ajudar a perceber o significado alargado ou ancestral de pardo:
O primeiro lexema bios- / pio poderia ter a ver com o proto-céltico *biwos, "ser vivo, ser mortal".
Bios-bardos e pio-pardo estariam a significar "ser vivo de cor parda" ou "ser vivo que pode ser caçado"? No mesmo processo que hoje vivemos com a deslocação do significado de palavras em galego frente ao castelhano (cheirar versus 
oler, lura versus calamar, pêssego versus melocotão) a expressão céltica teria ficado "inferiorizada" de animal de caça a animal imaginário usado em mofas.

No sânscrito a palavra परिधायक  (paridhaayaka) "cerca", está formada por Parī (परी) que vem sendo da mesma raiz que o prefixo latino peri- "em volta, em derredor, rodear, circunvalar":
Interpretando assim pardo, como par-/bar- + -do/-to "quem anda em derredor, que está rodeando, rondante" (como o urso) que explica o nome dos animais predadores do grupo do leopardo das línguas indo-iranianas, o pard "lince" francês, e o pardinho galego, ou o urso-pardo.
A presença do -b-  em bios-bardos, poderia ser por uma transformação do *bio-pardo inicial, ou poderia estar a dar uma ligação entre pardo e bardo no seu sentido de lugar bardado, sebe, estacada, chanta, numa ideia de "animal da barda, animal do lugar da caça".
No gaélico escocês 
bàrd "dique, sebe, cerca, terreno cercado, guarnição, corporação".
No asturiano 
barda além de ter esta ideia de tapume ou sebe, também é nome para a cor amarela brilhante.
Pardelha "rede de malha estreita".
E uma pardinha é uma chousa fechada, um couto ou devesa.
Isto leva a abrir a hipótese da toponímia "clássica" galega, que associa estes nomes de lugares com base em  pard-, tipo pardinhas ou pardinheiro, com paredes, por elisão par(e)de; e poder considerar que poderiam ter a ver com arcaicas bardas.

Conclusão:
A hipótese apresentada sobre a Armucela situa-a numa possível grande armada de caça, o que ajudaria a perceber a sua origem etimológica ligada à raiz que teria gerado armada (no significado de armadilha) armentio ...
Também isto situaria a sua "fundação" num tempo recuado da pré-história,.
Mostraria a continuidade que teria ocorrido desde os primórdios da caça passiva em coussos, até a sua transformação em lugares onde teria ido acontecendo a transformação de animais selvagens em semi-domesticados, e daí até a atualidade, com as partições posteriores do espaço, já inecessário para capturar ou acurrar rebanhos, conservando os seus caminhos perimetrais, e restos dos valos milenares.

Vilarensal

 

Esta é a imagem aérea do voo americano do 56-57 de Vilarensal, em São Martinho de Cabrui (Messia).
Nela pode ser observada a estrutura de cousso evolucionada a granja, que neste blogue é repetidamente mostrada:





Vai aqui uma explicação do seu funcionamento inicial, como cousso de caça:


A estrutura funcionaria como uma nassa, os animais, veados, corços, cavalos, zebros, auroques..., entrariam, e intentando buscar uma saída acabariam nos becos laterais, nos que a caça seria à espreita ou com foxos:



Para comparar com os chamados desert kites, por exemplo este plano de um do planalto de Ustyurt:
 
Modificado de Examples of Desert Kites por Olivier Barge.


Posteriormente, acabada a sua utilidade como caça, ou curro de animais semi-selvagens, a sua boca de entrada teria sido fechada e mantidos dentro animais em catividade em domesticação, para o maneio dos quais ainda seriam úteis os becos como mangas.



Então uma hipótese do que subjaz no topónimo Vilarensal poderia ser o evidente vilar e *ansal:

Sobre vilar neste blogue já foi apresentada a possibilidade da sua antiguidade, que pode ser lida no escrito Guilheto
O inicial vilar teria a ver com bilha "estaca". Então os vilares do paleolítico final e neolítico teriam sido estacadas, paliçadas.
Esta imagem levaria a pensar estacadas de caça, e posteriormente estacas que cercariam uma tapada para manter animais em catividade.
Se o palatio, paço, nasce de uma paliçada primitiva para resguardo das primárias habitações, ou de animais, talvez de uma pala, "refúgio", feita pelo ser humano.
Uma sebe de *will, de paus aguçados ou espinhosos, também pudo ter servido para defensa dos primárias *willas, vilas, ou talvez antes do que vilas *will-ares vilares ou *guilhares.
Assim um vilar entre outras cousas é:
En algunas comarcas llaman vilar a los campos de centeno que, después de sembrado, se cierran con un balado que no se derruba hasta que se siega, y queda el terreno a restreva o pallarega.
Leandro Carré Alvarellos (1979): Diccionario galego-castelán e Vocabulario castelán-galego, A Coruña, Moret


Sobre *ansal, neste blogue já foi tratado esse lexema ans- que costuma aparecer na toponímia galaica, Ansede, Ansemonde, Ansemil ...
Ansa é palavra em interjeição para levantarem o pé as cavalgaduras e mirarmos o casco. Palavra que apreendim de neno quando andava coa burra. Dá-se-lhe na perna na zona do carpo uma palmada suave e firme, à vez que em interjeição é ordenado: "Ansa!"
Sob paradigmas inferiorizadores e dependentistas usados para conhecer a origem da interjeição e voz de mando ansa: ansa seria um "vulgarismo" de asno ou asna, e asno seria derivado do latim asinus.
Cortando as amarras a estas ancoradas ideias, a palavra asno monstra raízes muito antigas:

Grafia suméria da palavra transcrita como ance ou anše, letra š que é usada na transcrição da escrita cuneiforme para representação dos fonemas /ʃ/ ou /t͡ʃ/.
"Ance, anse, anche ou anxe".








Sumério 𒀲 (anše) com o significado de asno, cavalo, equídeo qualquer.
Também no hitita anšu.
No sânscrito हंस (haṃsá), tem o significado particular de búfalo, cavalo, e o mais geral de cisne, ganso, ou ave migratória, mas também o de "movimento, caminhada" (segundo algum estudo a primeira sílaba ham- significaria "ir")(1) o que podeira estar a indicar que os animais que levam o nome de *ansa, estão a levar um epíteto "o do movimento, o que caminha, o que viaja", que supre pronunciar o nome verdadeiro do animal que é caçado e alimenta, que seria tabuado, como é frequente no indo-europeu e em tantas culturas humanas da caça.
O que levaria a poder lançar a hipótese de que a palavra *ansa, estaria a nomear aquele animal que se desloca, que viaja, que migra, pertencendo ao nostrático ou ao protoindo-europeu, por essa presença no sumério, hitita e na  toponímia galaica, datando-a no mínimo no paleolítico final (nostrático) ou no neolítico (protoindo-europeu).

Assim Vilarensal, suposto anterior *Vilar Ansal, seria a "paliçada para o (animal) que anda".

Tudo isto poderia alicerçar a Teoria da Continuidade Paleolítica.


(1) Isto abriria a porta a uma etimologia do verbo andar nesta raiz, confronte-se com andorinha.