© Copyright. Direitos autoriais.

© Copyright. Direitos autoriais

Açoreira em Santalha de Devesa, a sua Ciadela, e as Ciadelhas.

 Vai ser apresentada uma forma de cousso de nome Açoreira em Santalha de Devesa (Friol).
Açoreira, topónimo que já  foi analisado em escritos anteriores:

Açor é uma palavra de etimologia discutida, associada com accipiter latino.
Por uma forma vulgar *acceptor e daí *acc'ptor *actor, mas já no latim como astur, e no grego como no castelhano antigo adtor, no catalão e ocitano astor, no italiano astore, no francês autour, no francês antigo hostor, no sardo istore...
Poderia ser pensado que cada uma destas asas, azas laterais seriam em nome latino vulgar acceptor?
Desde o galego açorar, açoronhar ou açorejar, com o significado de assejar, espreitar; mover-se incansavelmente num lugar, agitar-se; incomodar, apressurar. Este verbo açoronhar está associado ao urso, ao galanteio amoroso, a rondar, a dar voltas em redor de algo que se deseja, atrair.

Açoreira, também pronunciado Açureira, mesmo grafado no âmbito linguístico como Assureira (Castro Laboreiro) seria outra  dessa toponímia de ave de rapina que aparece associada ao cousso, como já foi mostrado com Ninho d'Águia?
Talvez só como o lugar onde acontece a ação de açorar no sentido específico de espreitar.

Terá a ver o açor com o asura hindu?
Para confrontar como sânscrito सुर (sura).

O par de açor nas língua célticas estaria no bretão gwalc’h, e no galês gwalchou.
Neste blogue já foi dada uma hipótese sobre a toponímia -ulfe como protoindo-europeia e não do substrato germânico:
Uma linha P *wĺ̥-pos (confronte-se com volpe/golpe e lupus). É nesta linha P que *wĺ̥pos acabaria em dar *wĺ̥-phos e daí  *wĺ̥-fos (confronte-se com golfo e golfinho) e a linha germânica *wulfaz.
E uma linha Q: *wĺ̥-kos (confronte-se com urco ou o proto-eslavo*vьlkъ (vulku), sânscrito वृक (vṛ́ka) e वृष (vṛṣa). Nesta linha Q estaria o proto-céltico *wolkos que dá nome a aves de rapina: gwalc’h (br)
gwalchou (cy); no gaélico antigo olc "mau, demoníaco".



O diferente de Açoreira de Santalha de Devesa de outros coussos é que o lado leste tem dous limites, um o rio Narla, e um cômaro paralelo a ele:








O nome do beco oeste destaca Ciadela, que seria um diminutivo de ciada, já forma medieval para a cilada, no significado de espera para atacar, emboscada. Se imos ao significado latino de celata, ainda é mais evidente "trapela, emboscada, armadilha, laço, foxo de caça"; a micorotoponímia está a dar a utilidade do lugar em tempos paleolíticos (cousso) ou neolíticos (granja).
Ciadeva, poderia ser ciada-eva?, mas quem é Eva?
Poderia ser uma variação de Ciadela....
Já foi escrito que nestes becos costumam aparecer nomes de mulher com ideia de chefia, de governo, Orraca, Dona ... Eva poderia estar a dar essa ideia de "mater" ancestral, Ciadeva "cilada de Eva".
Este nome de Ciadela tem a norte um similar que é Fiadela, poderia ser uma realização da mesma palavra por essa pronúncia tradicional em falantes e zonas do efe, tipo civela / fivela com uma aproximação entre os fonemas /f/  /θ/.
Também Fiadela poderia estar a dar a ideia de filum, limite.
Filum tem uma etimologia tal que derivaria do protoitálico *fī(s)lom, do protoindo-europeu *gʷʰiH-(s-)lo-.
Filso é palavra pouco conhecida, dá nome à linde, ao limite entre propriedades.
Com a expressão "a filso" que significa "na linha mesma".
Filso tem o parente jilso ou xilzo, um arcaísmo que dá nome ao marco de pedra.
Ao lado de Fiadela está Fradela. Fradela faz pensar em frade, mas poderia ter a ver com o verbo fradar "podar, demoucar" com frádia "ramo, galho demoucado".

Outro topónimo que ajuda a perceber a função da Açoreira é o de Boca da Açoreira, o lugar de entrada, para o cousso de caça passiva:
Os nomes do beco leste: Cornelho e Picheira são transparentes, estão a dizer o mesmo com palavras diferentes, explicam a forma do beco de caça.





Identificar a Ciadela na estrutura da Açoreira de Santalha de Devesa, como lugar de cilada,  levanta a controvérsia com o topónimo da Ciadelha (Sobrado dos Monges):








Microtoponímia da Ciadelha que indica a sua ancestral função, de cousso de caça a granja neolítica. 
No beco leste há um campo de mámoas.

O nome oficializado é Santa Maria de Ciadelha, é o nome entre a população. Eruditamente pola presença do "acampamento romano", o quartel, recebeu e recebe nomes com ideia de cidade: ciudadela, cibdadela, cidadela. De feito o nome medieval remete a cidade:  Sancte Marie Cidadelie de Curtis.
Poderia ser que na altura do século X, Cidadelie fosse uma forma "erudita" de Ciladelie ou já Ciadelie?
Do mesmo jeito que hoje em dia, mesmo a nível de estudos universitários, o lugar é chamado "erradamente" de Cidadela?
Ao meu ver, e podo estar errado, *celatecula, ou *celatelia, diminutivos de celata "cilada / ciada" poderiam estar na origem da Ciadelha.


Esta outra imagem para perceber a génese e talvez o porquê do seu diminutivo de celata:


Então é possível observarmos uma estrutura de caça maior que a apresentada inicialmente, que no seu momento foi transformada em granja neolítica, com o topónimo identificativo Granja (por exemplo tratado no escrito "A Belém e ago das granhas").
Então a partição da Granja deixou ao seu leste uma granjinha menor a Ciadelha.
A Celata inicial ficou em Celatecula.
Tudo isto aconteceria em tempos neolíticos, por exemplo a Celatecula tem no seu beco leste um curro de um tamanho proporcional a si, que não serviria para a Celata maior, o seu nome é Chousa Nova, quanto de nova?, pois nova porque é um aditamento novo na altura, uma chousa que lhe foi acrescentada à tapada neolítica, com animais semi-domesticados encerrados nela.



É nessa parte em desuso da que foi a Celata maior que aparece uma zona murada para agricultura, a Cortinha:



Só mais uma cousinha sobre a Ciadelha-Granja:
As granjas, granhas neolíticas de exploração de animais semi-domesticados precisavam de caminhos fundos murados ou valados, para conduzirem os animais, corredoiras, algumas delas reutilizando vias de passagem das manadas selvagens que já tinham deixado grafado o seu passo, como o caso dos buffalo traces no norte da América.
Algumas de estas granhas neolíticas estariam comunicadas uma com outras para melhor gestão das pastagens.
Assim pode ser observado o relacionamento entre a Ciadelha e Ínsua:

Ou já entre a Ciadelha, Ínsua e Liofre:









Voltando à controversa origem de Ciadelha, neste caso outra Ciadela:




Neste caso a Ciadela no limite entre a freguesia de São Brais de Frojais e São Cosmede de Quintela de Hedroso (Viana do Bolo), fazendo a estrutura de um cousso evolucionado a granja neolítica, como a proeminência redonda que fecharia a antiga boca para criar assim uma frande tapada.
Ciadela que está no lugar da ciada, da cilada, da caça.
De entre os microtopónimos a destacar:
Campo da Gonza, topónimos de base em gonzo, já foram tratados neste blogue:
Poderiam estar aparentados com o grego e latim γόμφος (gómphos),  gomphus "gonzo", do protoindo-europeu *ǵómbʰos / *kómbʰos "ângulo". Confronte-se com o grupo Conzado / Gonzado. Onde o gomphus, hoje "romboide", inicialmente talvez só ângulo, está a descrever a forma essencial.


Neste caso de cima: a Ciadelha de São Lourenço de Pentes (na Mezquita). E para que fique mais evidente do que é uma ciada, no lugar há duas Ciadelhas, a própria, e a Ciadelha de Trás:



No seu beco oeste a Ciadelha de Trás tem o nome da Poula do Vendeiro, topónimos de base em venda associados aos coussos já foram mostrados em outros escritos, onde a venda pastoril, onde se ameijoava o gado à noite, teria uma raiz na venda de caça paleolítica.

Então poderia concluir-se com relativa evidência que as Ciadelas e Ciadelhas toponímicas estão dando nome a ciadas / ciladas, a lugares onde acontece a caça à espreita ou à espera.




Celadilla del Páramo (villadangos del Páramo, Leão):







Celadilla del Rio (Pinar del Rio, Palência)

Como interpretar os antropónimos:
Bartolonas, poderiam ser umas pessoas Bartolas. Por vezes os Bartolos / Bêrtolo / Bertolo estão sobre o lexema bert-, já analisado noutros escritos. Se observamos Bartolas é espelho de Espinar. Bartolas poderia ter a ver ou coma raiz que no galês e córnico perth / berth, espinho, de um proto-céltico *ku̯erku̯-t- / *ku̯ertu̯ (indo-europeu *perkwus "carvalho") com o gaélico antigo ceirt; com topónimos galego tipo Bertim, Bertomil .... Proto-céltico *ku̯erku̯-t que teria a ver com o latim quercus.
No celta p e celta q esta palavra de vedação teria um protoindo-europeu *perku̯u e indo mais atrás a um anterior celta-p e celta-q: *ɸert.
Corraladas tem o espelho de Corrales de Félix Pozas, que sim poderiam ter sido uns currais de uma pessoa de nome Félix apelidado de Pozas. Pozas é um microtopónimo presente no cousso, com El Pocillo no seu vértice central e o regato, rambla, central com nome de Valdepoza.
Felix no latim tem o significado de feliz. Mas também: que traz boa sorte, de bom presságio, auspicioso, favorável, propício, afortunado, próspero.
Então poderia ser interpretado este Félix Pozas como um "poço/foxo (de caça) favorável".
Indo um pouco mais além, felix leva uma desinência -ix que indica ser um genitivo feminino arcaico no latim, "da fel(es), da gata", ficando uma "poça da gata".




Castro de Lobos

Vão ir sendo apresentadas diferentes imagens de Castro de Lobos e a sua estrutura de cousso, evolucionada a granja neolítica.
Castro de Lobos na freguesia de São Paio de Paradela Toques





Podem ser observados os assentamentos humanos ancestrais nos becos da estrutura, no seu lado oeste a jazida do Paleolítica Superior das Penas dos Raposos, e a da Ínsua do Calcolítico. Já no leste há identificado um Abrigo Paleolítico e a presença da Castronela, a própria pequena briga de Castro de Lobos, poderia ter sido uma continuidade de um assentamento simétrico aos de Ínsua ou Penas do Raposo.
Há muitos exemplos da presença de uma castro na ponta de um beco de uma estrutura de caça paleolítica ou granja neolítica no escrito "Castro? Vai de ida ou vem de volta?"



O beco oeste aparece bastante indefinido, com chousos que talvez o foram partindo.
O beco leste tem menores variações, finaliza na união do regatinho  com o regato das Cancelas que continua com o nome de Rio do Porto Vaamonde.
Neste blogue teem sido apresentados muitos exemplos onde o funil da caça finaliza numa branha ou tremedal ou num rio; dá para entender que num lugar lamacento o animal perde a sua agilidade e é mais fácil a sua caça, também ocorre o mesmo se o animal entra na água, mesmo se é feita uma pequena represa.




Uma imagem do cadastro sobre a foto aérea do 1956, assim como a toponímia ajudariam a perceber a evolução do cousso, desde um espaço pequeno menor até um tamanho maior, com diversas variações do beco oeste.
De entre a toponímia a destacar:
O nome de Bica para o ancestral beco / bico leste da suposta primária forma do cousso.
E em espelho a Bica, nessa primária forma, a Chousa da Falva. Que nos leva ao latim falva / falvus "parda, pardacenta". Supostamente uma palavra latina apanhada das línguas germânicas( proto-germânico *falwaz).
Falva tem a forma patrimonial galega fouveiro "baio/alação ou castanho claro".
Como foi explicado no escrito "Bistulfe, os bois pardos", a toponímia associada a estas estruturas de cousso, granja neolítica, que fazem referência à cor parda, estariam a "falar" do animal caçável, com um eufemismo, que foge de manifestar o nome verdadeiro tabuado.
Também nestes lugares costuma aparecer o topónimo marcado pola cor branca, tipo pena branca, neste caso Chousa Branca.

Também o frequente Santas no lado oeste, numa das supostas evoluções do beco, na ideia de ter sido Antas.

Quanto ao nome do lugar habitacional, Casto de Lobos, a estrutura aparentemente não seria a própria para lobos. Talvez o seu nome ancestral, castro de x, esse x fosse um nome tabuado tipo pardo, ou falva, para um indeterminado animal a caçar, que na nova camada linguística acabou traduzido a lobo.
Confronte-se falvus com fulvus.
Para Pokorny:
germ. *falwa- in aisl. fǫlr, ags. fealo, as. falu, ahd. falo, falawēr `sallow, paled, falb' (in addition as `graue ash' aisl. fǫlski m., ahd. falawiska `ash, Aschenstöubchen'); *falha- (: lit. pálšas) in aleman.-rheinfrönk. falch `falb, esp. from hellbraunem Vieh'; *fela- or *felwa- in west föl. fęl `falb', fęle `fahles roe deer, fahles horse'.
A destacar que a cor soa dá nome ao animal dessa cor, como rúvia na galiza dando nome, não proprio,  a uma besta ou uma vaca.
Que o beco leve o nome germânico ou do neologismo latino pegado do germano, não faz com que a estrutura seja de esse tempo no que essa camada linguística vigorou por cá, simplesmente é uma capa sobre o nome ancestral que teria sido ou uma tradução, mais ou menos literal ou uma adaptação aproximação da palavra primária à nova língua (isto faz-se muito evidente na toponímia gaélica e córnica).

No proto-céltico *wailos, gaélico faol é o lobo, mas faol é também adjetivo para dizer selvagem, no irlandês medieval fáel.
No galês belau, é o lobo ou qualquer animal predador. Para alguma escola galesa o étimo comum ao galês e gaélico seria o proto-céltico *belaṷū.
Poderia haver uma raiz protoindo-europeia em falvus / fulvus tal que *fal-wós‚ numa adjetivação verbal, onde o primeiro lexema *fal- seria um verbo?
Para a etimologia clássica o proto-germânico *falwaz, teria que ver com o protoindo-europeu *pelH já dando nome a uma cor.
As cores como adjetivo ou nome indefinido, é pensado pegar o seu significado abstrato, de algo concreto.

Imos pôr o suposto étimo da escola galesa para os fáel, faol faoil, fael, faelaib, failad, faelad gaélicos e para os britônicos (córnicos e galeses): bleydh; belau, bele, bela, bala, bali, para o gaulês bledinos "adjetivo que identifica com o lobo", aparentado com o latim belua / bellua "monstro" :*belaṷū, à par do proposto étimo para falvus, *flawaz:

*belaṷū
*fal-wós / fal-uus.

Para o céltico *bela-ṷū: a raiz etimológica *bela teria a ver com o galês bela "matar, espancar" do proto-céltico *belA-"morrer, morte" do protoindo-europeu *gu̯elH- "atacar, esfaquear".
Ou estaria este grupo de palavras na raiz de Pokorny *bheleu- "bater".
Então seria a raiz verbal buscada "morrer/matar" sobre a que se sufixa o protoindo-europeu *-wós, latino -uus / -vus. o que morre e o que mata: *bhel(eu)wos.
Confronte-se com belém no seu significado de briga, confronto; e como o asturiano belén "agitação, confusão, enredo".
Confronte-se baleia, ballaena (la), φάλαινᾰ (grc) (phálaina), e bleidh (gd) "monstro marinho",  bled (sga) "monstro marinho, baleia".

Na Galiza poucos mais topónimos encontro do grupo Falva, Monte Falvão (-ám):

Ego, Sancio Afonso, conomento Galizia, vobis, priori Pelagio Moreda et fratres monasterii Sancti Petri de Rocas, facio kartam donacionis, pro remedio anime mee et parentum meorum et pro precio aderato que mihi complacuit, de hereditate mea uno kasale que habeo in Lagenoso cum quantum ad ipsum pertinet, in territorio Aquilare, subtus monte Falvan, discurrente rivulo Alesgos, sub signum Sancti Petri et Sancte Marie. Venda. 1136. San Pedro de Rocas.

Monte Falvão (-ám) em Santa Olaia de Esgos, o caminho desenha uma estrutura em cousso.