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A balteira e Mary Noy

 



Baltuílhe de Abaixo (Vila Franca do Berzo) escrito administrativamente sob o Reino da Espanha como Valtuille de Abajo.
Em época medieval Baltuix.
Com forma de cousso e toponímia identificativa como tal: Cousso.

Baltuílhe de Arriba (Valtuille de Arriba) a norte de Baltuílhe de Abaixo, também no concelho de Vila Franca do Berzo.
Esta forma medieval Baltuix, semelha dos gentivos femininos "da *balta".

No escrito sobre a Orraca, e outros, foram apresentados coussos que hipoteticamente a sua toponímia indicariam ter sido de "governação feminina".
A lenda: The Story of Madame Noy comentada no escrito "alguns coussos e cousas da Cornualha" ajudaria a perceber esta governação feminina da caça passiva ou à espreita, do paleolítico-neolítico e sua transição à pecuária:

She was fond of going to law, and had always suits on hand concerning the bounds and common rights of her lands. She is said also to have kept the best hunter and hounds in the West Country, and that she coursed with them daily as she rode over her farms, across hedges and ditches, to inspect her work-people and stock. We suppose she was a widow then, or if she had a husband he made too little noise in his time to be remembered.

Ela costumava recorrer à justiça e sempre tinha processos abertos relativos aos limites e direitos comuns de suas terras. Diz-se também que ela mantinha os melhores caçadores e cães de caça do oeste do País e que percorria com eles diariamente enquanto cavalgava polas suas fazendas, através de sebes e valas, para inspecionar os seus trabalhadores e o seu gado. Supomos que ela era viúva na época ou, se tinha marido, ele era pouco notório na sua época para ser lembrado.

Esta lenda desenvolve-se neste cenário:




Os elementos a destacar na senhora Mary Noy seriam as funções da matriarca paleolítica-neolítica:
A propriedade privativa e a lei.
Caçadora ou diretora da caça com os melhores cães e que tem ao seu serviço caçadores.
Vigia as sebes e valas, entenda-se que o território está delimitado por um foxo e um valado.
Vigia os seus trabalhadores e o seu gado (continuidade neolítica, na transformação do cousso em grande tapada para manter animais semi-domesticados cativos).
Pressupõe-se que era viúva ou o seu homem era pouco notório. Desde o entendimento do passado recente é assim explicado, mas isto poderia ser uma camada que levantada identificaria uma situação poliândrica, talvez explicável não apenas por cultura, também por uma situação obrigada de supervivência e escassez de alimentos.
Por qual razão ela é de nome Mary Noy?
Poderia ser uma casualidade, Mary seria nome das Evas primordiais da humanidade? (1).
Quanto a Noy situa-a como da família de Noé, supervivente do dilúvio, o que a sediaria no período da humanidade no que tivo / teve que haver grandes deslocamentos populacionais por subidas rápidas do nível do mar.

Parede submergida na Enys Sampson da freguesia de Enys Skaw (Tresco) do arquipélago das Sorlingas, Ynysek Syllan / Scilly, Cornualha. Foto tirada de "The Conversation".


Imagem LiDAR do lugar mostrado na foto superior, na parte norte da ilha Sampson das Sorlingas.

O muro leste submergido, o muro oeste está cheio de restos arqueológicos neolíticos, cistfaen, cistas, túmulos, um círculo de pedras.
Isto é para mostrar como a subida do mar tivo efeito sobre a economia da caça, ou já da exploração pecuária. E talvez como essa grande transformação ficou nas lendas.


Voltando a Baltuílhe e ao seu nome medieval Baltuix, o sufixo -ix, leva a pensar no feminino como foi dito, como um arcaico genitivo feminino "da *balta" ou mesmo agente do mesmo modo que -trix "a balteira".
Este grupo de topónimos do grupo Baltar neste blogue fôrom mostrados como célticos ou já protoindo-europeus:
*balt-/ *wlatis "soberania" no proto-céltico. E portanto a proto-balteira poderia ter sido a soberana, nos âmbitos do território, e da religião.
Então pode ser percebido que a barda, a sebe de vedação e o bardo como poeta e cantante na antiga cultura céltica, poderiam ter nascido da mesma raiz da transição da caça ao pastoralismo?
Assim o bardo cantor apenas seria uma especialização da figura do neolítico *wlatis, *waltis, pastor soberano, e posteriormente chefe do pastoreio, gerenciador da οἰκονομῐ́ᾱ (oikonomíā), gestor religioso.
Assim o bardd galês tem os significados de bardo, poeta, autor literário, profeta, filósofo e padre / crego.
Ducange compila bartaSilvæ species.
Hipoteticamente *wlatis como figura de soberania de possessão , seria uma transformação da *walta / *warta "sebe, muro limitante".
Assim, baltre "fochanca, rodeira" ou "baltrão"leito de um rio, estão a dar a ideia fosso exterior que acompanha ao muro nas vedações ancestrais (valo/vala).
Confronte-se com o par rei e rego.

Assim chega: Maria, a Balteira, a soldadeira da lírica medieval protagonista de bastantes peomas. Maria Baleteira que era dona de Armea, hoje freguesia integrada no município de Coirós:

São Vicente de Armea (Coirós), com os topónimos pecuários neste blogue analisados, a Cruz no bico, Pedreira também na ponta, com a típica estrutura circular para "fazer mó" (Brasil) fazer que a boiada descreva espiral, para parar, na estereotipia, acalmar-se.
Também o Castro como secundário ao local primário hoje igreja.


Então teria acontecido uma transformação cultural, a meu ver recente, século XII, XIII, desde a ancestralidade dilatada da função da mulher com soberania, nascida no tempo do paleolítico, dona de um território de caça, posteriormente de um território pecuário, pessoa com funções religiosas, druida, barda, cantora, dançarina..., acabou num "atual" insulto baltroteira "suja, indecente, mentirosa".
A esta função teria-se-lhe tirado o poder, na altura das cantigas que fazem escárnio de Maria Peres, a Balteira?
Assim na tenção entre Vasco Peres Pardal, Pedro Amigo de Sevilha:

- Pedr'Amigo, quero de vós saber  
ũa cousa que vos ora direi;
e venho-vos preguntar, porque sei
que saberedes recado dizer:
de Balteira, que vej'aqui andar,
e vejo-lhi muitos escomungar,
dizede: quem lhi deu end'o poder? 

Então o que é lido nas cantigas medievais sobre Maria a Balteira, Maria a soberana, estariam a ser os restos de um dos roles da mulher no exército? Talvez da tradição celto-galaica, role que está a ser "criticado" por umas novas modas de pensamento, já caindo na pejoração.
Do primário cenário inicial de mulheres sedentárias, donas e consertadoras de um cousso, com homens ao seu serviço, ou acolhedoras das fianna itinerantes, chegamos até a baltroteira.





Então no lugar de Baltuix, "da *Balta", achamos o cousso paleolítico e à par a Rata, a alfândega de entrada ou passagem para briga, neste caso Bergidum.
A meu ver, e poderia estar errado, todos cenários de poder feminino:










Balteira de Santa Maria da Pedra (Carinho).



A Balteira entre Santa Marinha da Ponte (Viana do Bolo) e São Cristovo (Vilarinho de Conso).










(1) Moura e Maria relacionariam-se? O nome gaélico escrito Maire, é pronunciado algo semelhante a /mow.ra/
Maire / Moire / Muire, nomes gaélicos de Maria têm relação com o mar , em gaélico muir?
A família em gaélico é dita muirín, muire-ín, algo assim como "mari-inho", ou "da Maire", "da Maria".
Então temos o nome atual gaélico de Maria /mow.ra/ como marinha ou do mar, e também a ideia de mar como Além (morte).

Cnoc na Teamhrach

Neste escrito vai ser analisada a toponímia que envolve a famosa Colina de Tara, Teamhair Na Rì, também conhecida como Cnoc na Teamhrach, ou Teamhair,  em inglês Hill of Tara.

A partição das terras revelaria uma estrutura ancestral, interpretada desde a paisagem galaica como um cousso, da transição do paleolítico para o neolítico:







O cousso com uma funcionalidade multimilenar, daí que seja possível observarmos transformações, acabaria transformado em uma grande tapada, que poderia servir como "couto ou parque de caça" de animais silvestres em catividade, ou como local onde manter e cuidar animais em semidomesticação.



De norte a sul toponímia da estrutura que abrange a Colina dos Reis, Teamhair Na Rì:

Baile Caisleáin na Teamhrach Vila do Castelo da Colina dos Reis.

Baile Shiurdain, com nome no século XV de Jurdanestoñ iuxte Tauragh.
Entende-se que é a vila de uma pessoa apelidada de Jordan, ou Jurdanes.
O nome de Tauragh, referido à Teamhair,  é relevante pois podeira ser algo assim como "do touro"?
Também escrita antigamente como Taueragh.
De um proto-céltico *tarwaikos?
Confronte-se com a pronunciação de tarbh "touro" em gaélico escocês e em irlandês.

An Chabrach, pode ser partido em dous lexemas cabra-ach.
-ach deriva do proto-céltico -aikos.
Cabr-, pode ter diversos significados entre eles cabra "sepulcro".
Mas também cabrach significa bosque e charneca, terra pobre, também musgo da madeira.
Estes significado de charneca ou terreno pobre, fazem lembrar a carva galega: deserto, chaira de monte sem habitar; carvalho que cresceu pouco e retorto; mata arbustiva de carvalho; carvalho-negral, (Quercus pyrenaica), carvalho-alvar, (Quercus petraea).
carba asturo-leonesa: mato, monte pedregoso, encosta de vegetação baixa, brenha; monte comunal para pasto, baldio onde abunda o mato baixo; mato de tojos, fetos e urzes.
Outro significado de cabrach é o de veado, cervo.
Já no proto-céltico como *karwo "cervo".
Poderia então ser aberta a hipótese de que o cervo gaélico teria sido algo assim como o *kabraikos "o da carva", o animal que anda no terreo de mato arbustivo. Ainda que a sua proximidade com a cabra e o proto-céltico *karwo, tiram-lhe força a esta suposição.
Seja como for o recinto que desenha ainda hoje a divisão das terras na volta da Colina dos Reis, Teamhair Na Rì, levaria a pensar que a origem de an Chabrach poderia ter sido um proto-céltico *karw(o)aikos "do cervo, *cervego, cerveiro".
Ou *karb(a)aikos "o da carba, o do mato arbustivo", sendo o nome do cervo um epíteto, na tradição indo-europeia de ter o animal um nome tabuado, quase nunca pronunciado.
Confronte-se com o escrito "a voltas com o Zebreiro" onde é postulada a proximidade entre cervo e zebro, e xebrar, sebe, sendo o cervo "o separado".
A meu ver, e podo estar errado, estas hipótese interpretativa de An Chabrach como "o da carva / o do cervo" é congruente com os coussos e tapadas que na Galiza foram interpretados sob a toponímia de  "carvoeiros", desenvolto no escrito que vai o enlace.
A continuação vai uma imagem de um cerveiro/carvoeiro galego e a de Teamhair Na Rì:

Estrutura de Carvoeiro e Cerveiro de Abaixo, entre as freguesias de São Jurjo de Goá e São Jião de Santa Cristina (Cospeito) com forma de cousso ou granja neolítica.


Estrutura que envolve Teamhair Na Rì.

Então, a hipótese até aqui: haveria um lugar sacro sacrificial no alto de um outeiro com uma ara, pedra, sacrificial, no outeiro do touro, na ideia de macho ruminante, não apenas vacum, *tarwaikos dentro de um recinto ancestral de caça, que no neolítico teria sido transformado em granja de cervídeos *kabraikos.


Continuando:


Riverstown, conserva o nome anglizado, no século XIV foi Ryverestoun. Ryvere é uma palavra do inglês antigo que significa rio.

Baile Bháinín, báinín pode significar tecido de lã, mas também ser um derivado de báin que complica dar um significado seguro, entre os possíveis báin é uma forma de bán "pardo, pastagem" com o sufixo -ín diminutivo, "vila do pradinho" poderia ser.
Bàn em gaélico escocês é o lado esquerdo do rego do arado, Baile Bháinín estaria a ser nomeada pola sua situação nas proximidades do beco esquerdo?

An Fóidín, da turfinha (turfa) do terrãozinho, ao ser um talho, um pequeno terreno.

An Castelean Buí, o Castelo amarelo.

Baile an Ringéalaigh,  um dos nomes recolhidos no XIX foi Baile An Rin-Géil.
Considera-se um antropónimo, um nome de família.

Odder é pensado ser uma palavra inglesa "muito raro, muito ímpar", no século XIV escrito como Othir, o que indicaria uma origem diferente ao inglês.
Leva a pensar em oitir "barra de areia, baixo, promontório"  pola sua posição no final de um hipotético beco poderia ser.



Ross, também é pensado ser nome inglês, foi interpretado como Ros "madeira".
Ros gaélico tem diversos significados entre eles  "promontório, istmo, península".
É para salientar que os dous becos levariam um nome com o significado de promontório, a oeste Odder hipoteticamente oitir, e a leste Ros.

Belpere, tivo também o nome de Rath Meádhbha.
Belpere
soa a pedra bela, fazendo referência a Lia Fáil ao padrão?
Rath Meádhbha, rath é um vilarejo rodeado de valo alto de terra, ou muro, Meádhbha é genitivo de Meádhbh, nome pessoal feminino, que é derivado do proto-céltico *medwos "bêbedo, drogado". Este rath é o que encerra a hipotética grande tapada, numa posição de alfândega, de passagem, de entrada:




Então a seguir criando a hipótese funcional, a grande tapada, onde seriam mantidos veados para talvez uma caçaria selvagem, e o sacrifício ritual, teria um espaço de entrada que habitaria uma ordem feminina religiosa, uma meiga, uma sacerdotisa, uma ancestral xamã.