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Boi Louro

 

Boi Louro na freguesia de São Martinho de Bandoja (Oça-Cessuras).







Boi Louro de Bandoja, apresenta-se como um pequeno cousso de caça, talvez com dous níveis evolutivos. Abraça o vale do rio das Golfas.

Sobre a toponímia do grupo golfa / golf- já neste blogue se tem escrito, lançando a hipótese de que a sua origem teria sido na altura do protoindo-europeu:
Cortado e colado do escrito "a Ulfe":

A raiz das palavras para lobo, e não só, também para fera em geral, no proto-indo-europeu partiriam de *wĺ̥kʷos. No germânico *wulfaz onde há uma transformação da consoante k em f, talvez um prévio ph ou um anterior p?

Assim para o lobo haveria uma linha mais antiga: *wĺ̥kʷos.
Com dous descendentes:

- Uma linha Q: *wĺ̥-kos (confronte-se com urco ou o proto-eslavo*vьlkъ (vulku), sânscrito वृक (vṛ́ka) e वृष (vṛṣa).

- E uma linha P *wĺ̥-pos (confronte-se com volpe/golpe e lupus). É nesta linha P que *wĺ̥pos acabaria em dar *wĺ̥-phos e daí  *wĺ̥-fos (confronte-se com golfo e golfinho, com o gaélico escocês uilp, uilpean, uulp "raposo") e a linha germânica *wulfaz.

Estaríamos então diante de uma palavra com dous lexemas?
*wĺ̥kʷos: *wĺ̥ e -kʷos.

Assim palavras que dão nome à raposa, comumente concebidas como derivadas do latim vulpes, têm outra perspectiva como mais diretamente ligadas a 
*wĺ̥kʷos:
Urpe raposo em lígure.
Olp, volp, golp em lombardo.
Golpe no dialeto de Sena.
Gorba e orba nos dialetos marchigiani.
/w'o.lə.pa/ em Alatri no mesmo Lácio, berço do latim.
/y'o.lə.pa/ em Campobasso (Molise).
Gurpe num dialeto sardo.
Gulp, wolp, nas falas romanches.
⁠⁠Goupil⁠, ⁠gopil⁠, gopile, gupil⁠, ⁠gouspil⁠, ⁠woupil⁠, ⁠wupil⁠, ⁠houpil⁠, ⁠hopil⁠, ⁠oupil⁠, ⁠golpil⁠, ⁠volpil⁠, ⁠vulpil⁠, ⁠holpil⁠, ⁠houplil⁠, ⁠gourpil⁠, ⁠gorpil⁠, ⁠guorpil⁠, ⁠vourpil⁠, ⁠vorpil⁠, ⁠vurpil⁠, ⁠worpil⁠, ⁠horpil⁠, ⁠ourpil⁠, ⁠welpis⁠, ⁠guerpil⁠, ⁠verpil⁠, ⁠werpil⁠, ⁠virpil⁠, ⁠grepil⁠, ⁠colpil⁠⁠, no francês antigo.
Gaélico escocês uilp, uilpean, uulp.
E os já galegos volpe e golpe.

Para Pokorny a raiz *ol- [ol-(e)-] teria o significado de "destruir", e mas também ol- [el-1, ol-, el-] teriam o significado de "vermelho, pardo, castanho".
O lobo ainda a dia de hoje tem nomes tabuados.
Segundo isto *wĺ̥  -kʷos seria "o destruidor" ou "o apardado, o acastanhado", dando-lhe à raiz -kʷos uma função derivativa adjetival, latim -cus, proto-céltico -kos.
Daí que 
*wĺ̥kʷos poderia estar na raiz do nome de animais diversos ou mesmo fantásticos hoje, como o urco, a orca, o urso, o volpe, o golfinhoo lobo ... dá para reparar no nome de urca usado em Trás-os-Montes para a égua, confronte-se com o proto-iraniano  *(w)ŕ̥šā "animal masculino", ou com o proto-germánico *hrussą "cavalo".
Do mesmo modo que a besta é chamada de besta, também pudo ser chamada de *ulfa/*ulka, e no transmontano urca.

Então oĺ̥kʷos, oĺ̥ekʷos, eĺ̥kʷos elkʷos  / estariam na base do epos gaulês, do hippos grego, do equus latino, no celtibérico ekua-, e da iccona (Cabeço das Fráguas).
Confronte-se com elk no inglês, alce, ou com o proto-céltico *el- "ruivo, castanho" na palavra proto-céltica *elani; antigo irlandês: elit "corça / cerva"com variantes 
elit, ailit ailite, elt, eillti, eillte, eilit, eillti, elte, ellt, eillteadh. Galês: elain, eilon, alan "cervo".
Na escrita do S.O. (Bronze) alkuinterpretada 
(Koch 2019) como alce, como falcão, ou como lobo.
Este lexema el- para o cervo aparece em outros idiomas:
Arménio antigo: եղն (ełn) "cerva".
Grego antigo:  ἔλαφος (élaphos)
Línguas eslavas: *eleňь 
Lituano: élnias...

Todos eles, se quadra, nomes tabuados, condizente co protoindo-europeu "o pardo, o vermelho, o castanho, o ruivo"

Topónimos galegos de nome Ulfe costumam levar o artigo em feminino "a Ulfe", o que me leva mais a pensar que "a da besta" nome para qualquer equídeo, genérico, seria uma "tradução" de um conceito galaico arcaico expressado com a palavra na altura: a *ulfe.
Ulfe poderia ser genitivo, "da ulfa / do ulfo".
Seria pois a considerar que os topónimos da família de ulfe poderiam estar a se referir genericamente a um animal destrutor, uma besta, ou a um animal pardo, acastanhado, em nome tabuado.


Então neste caso do rio das Golfas de Bandoja, segundo a hipótese mostrada acima, estaria a dizer que é, era um rio das bestas, ou de qualquer animal selvagem, com possibilidade de ser caçado, daí a estrutura de cousso no seu vale.
Isto abre a ideia de que toponímia de base golf- poda ser interpretada assentada num animal bravo, e que a sua origem poderia ser muito arcaica, neolítica.
Assim toponímia de lexema golp-, como Golpilheira, além de poder estar sediada no evidente golpe "raposo", abre a porta a ser analisada como que está a indicar um local de bestas ou animais selvagens.

A interpretação do topónimo Golfas, como proveniente de *wĺ̥pos / *wĺ̥-phos / *wĺ̥-fos "a parda, o castanho, o vermelho", ajuda a interpretar "Boi Loiro" não apenas e restrito a um boi tal qual hoje percebemos, um animal bovino macho de cor alourada, e sim como uma tradução de golfas / golfo / *wĺ̥-fos "o (animal de nome tabuado) de cor parda, vermelha, neste caso loira".
Boi, protoindo-europeu *gʷṓws, poderia ter sido no passado um nome genérico para qualquer animal silvestre grande, que ficou posteriormente especializado para bovinos, e no caso dos romanços, e algumas outras famílias linguísticas, para bovinos machos.










Outro Boi Louro já foi mostrado indiretamente neste blogue no escrito "Bistulfe, os bois pardos", neste caso na freguesia de Fisteus (Cúrtis)












Neste caso a Fonte do Boi Louro em São Julião do Carvalhal (Santiago de Compostela).
A Fonte está no lado leste de uma estrutura em forma de cousso da que apenas teria ficado o seu lado oeste, hoje já tudo apagado pola concentração parcelária.





Boi Louro em Vilar de Santos.




Boi Louro de Santa Maria de Troitosende (Avanha)


Pena do Boi Louro em São Jurjo de Augas Santas (Palas de Rei).
No seu leste pode ser visto o desenho de um pequeno cousso, que leva o nome da Chousa das Raposeiras. Que depois do explicado acima, não seria um local de caça exclusivo para raposos. Talvez o atual raposo seja uma "tradução, reinterpretação" do topónimo antigo: talvez com base em golpe?
Confronte-se com, por exemplo, Golpilheiras / Golpelheiras de Santalha de Dumpim (Castro de Rei):















O caso de Marce e do Verbo.

 

Este é o plano cadastral nas proximidades da aldeia de Marce na freguesia de São Tiago de Vilar de Ortelhe (Pantão).
Nele pode ser observada uma estrutura de caça, um cousso, com diferentes evoluções:


Como em tantos outros casos analisados, no bico costuma aparecer um local religioso, neste caso a Capela de São Martinho. É relevante que o curro posterior ao beco, a aldeia, leve o nome de Marce, como  genitivo de Marcus, Marci.
Nestes coussos já se tem mostrado que as advocações têm relação com a funcionalidade do lugar. Neste caso São Marcos, que para a etimologia latinista seria um derivado de Marte.
Sobre Marte e Martinho e os equídeos, tem-se desenvolto neste blogue, em diferentes escritos, uma ideia diferente que seria tal que: Marcos não derivaria de Marte, que ambas as palavras seriam a expressão da mesma ideia, uma no galho itálico e outra no galho céltico:

A etimologia do latim Mars (Martis) antigo latim Mavors vai dar a um proto-itálico *Māwortis.
Com palavras do tronco céltico para nomear equídeos:
Gálata: μάρκαν (márkan)
Gaulês: markos.
A confrontar com o proto-germánico *marhaz.
Todas as formas de um hipotético protoindo-europeu: *márkos.
A ideia poderia ser que égua, cavalo, teriam um nome tabuado, como é frequente no protoindo-europeu,  *mar-kos, seria um epíteto, com a possibilidade de ser algo assim como "da *mare, do *maro, da *mara".
Podendo ser "da mãe", como animal consagrado à divindade feminina?


Segundo este fio etimológico e segundo a funcionalidade do curro posterior ao beco do cousso: Marce, poderia significar "do cavalo", de um hipotético genitivo galaico *marki, cognado do gaulês markos. E a escolha do orago como São Marcos, poderia vir determinada pola divinização do animal "São Cavalo".

Relevante é o nome de Ichó, que é uma palavra patrimonial, uma armadilha para caçar páxaros, uma trapela sobre um buraco na terra.
Pardal foi tratado noutros escritos como topónimo associados a estas estruturas de caça.

Para reparar finalmente no Verbo.
No carro de bois trasmontano, barbião, berbião, burbião é o madeiro no que, na parte anterior e posterior do carro, entra o espigão das cancelas que limitam, fecham o tabuleiro.
Berbião é nome para o estadulho ou fueiro, especificamente para os dous estadulhos dianteiros e os dous estadulhos traseiros, com o cognato asturiano berbión que também dá nome aos fueiros.
A confrontar com barbeito no significado de valo.
Barbetio como terra em pousio, ou como terreno agrícola, teria a sua origem em vervactum, do verbo vervago.
Barbeito como nome do valo, poderia ser um deslocamento do significado da palavra. Ora, aqui é proposta outra origem, que estaria associada a paliçada, sebe, estacada, e a esta família do barbião.
De entre os significados de abarbeitar, estes:
- Copular a fêmea com o macho, sobretudo no gado vacum e equídeo
- Emprenhar com a prontidão precisa uma vaca, parindo um vitelo cada ano
Entenderiam-se desde a explicação de Plínio o Velho, de vere + ago "guiar à primavera"?

Outra palavra mais para pôr neste conjunto é berbonta "broto, vergasta de uma árvore".
Estas palavras de paus, em geral na Gallaecia paus fortes, excepto berbonta, teriam a ver com o latim verber "chicote, vara, correia da funda de arremessar pedras".
O lituano ajuda a perceber o conjunto com a palavra vir̃bas "vara, ramo, bastão".
A palavra mais central de este grupo poderia ser a proto-eslava *vьrba "salgueiro". De um proto-balto-eslavo *wirb- "virar, girar, torcer".
Sobre o salgueiro e a sua relação etimológica com a vedação pode ser lido o escrito "Cortiças".
Outra palavra relevante para juntar com estas seria a asturiana güerbu, que em distintas zonas tem os significados de "lenha fina / ramo seco para prender o lume, lenha grossa / raminhas finas para o lume, tição".
Então o topónimo o Verbo neste lugar poderia ter relação com uma paliçada viva de salgueiros ou com o lugar onde está a volta?


Outro Marce:

Marce de São Vicente de Coeo (Lugo).
Pode ser observada a forma incompleta do cousso, do que ficou a parte oeste.
O seu outro lado "comido" por uma chousa nova, toponimicamente Chousa do Barredo e Chousa Nova. Mas quanto de nova é a Chousa Nova? É nova a respeito do antigo cousso, mas seria a meu ver também uma construção neolítica:








El Marce, na freguesia de Llavandera (Xixón).





Vilamarce de São Pedro de Santa Comba (Lugo).











Marque entre as freguesias de São Miguel de Moreira e Santa Marinha de Ribeira (na Estrada).




Marcela de Santa Maria de Silvela (Friol):


O Marquinho de São Jião de Lardeiros (no Pino).


Marcelhe com São Martinho na freguesia de São Martinho de Guilhar (Outeiro de Rei).
Aqui como foi indicado etimologicamente anteriormente, aparece associado o *marko com o Martinho.

Marcelhe de Santa Maria da Torre (Vilalva).



Marcelhe de São Bartolomeu de Ínsua (Vilalva).
Neste caso como no anterior aparece o topónimo Merlão, já tratado neste blogue, com ideia de boca, lábio, no escrito sobre Sálvora.
Boedos, este caso já foi analisado noutros escritos: na etimologia mais divulgada galega Boedo é referenciado como topónimo de lugar alagadiço, branhento, mas não há que esquecer a definição do dicionário da Real Academia Galega do 1913-1928:
Establo, majada donde posan bueyes.

Marcelhe na raia entre São Tiago de Meilão e Lugo .
Entre os nomes relevantes:
Penela do Vento é transparente, Vento foi analisado noutros escritos, tendo relação com venda, pousada, lugar de reunião de pastores e gado (nos Coussos).
 E também o aparentemente duplo Carreira e Rosende
Carreira é transparente, que costuma nomear antigos caminhos, no caso de Rosende a etimologia aqui proposta de -sende:
...a etimologia mais divulgada considera uma partícula a fazer parte de antropónimos germânicos, e que neste blogue foi mostrada a possibilidade de serem de um estrato linguístico ancestral:  protoindo-europeu *sent-, proto-céltico *sentus "caminho, senda"...
A partícula ro- de Rosende poderia ter a ver com o protoindo-europeu * ḱr̥sós, *ḱers-  "correr", senda de correr ou senda do cavalo. Ro-sende poderia ser uma forma germânica, ou uma tradução germânica de Marcosende.
Confronte-se com Marcosende de São Mamede de Zamães / Zamáns (Vigo):

Marcorãos de São Pedro de Folhadela (Melide).



Topónimos Marco poderiam estar a falar do marco, esteio de pedra territorial, ou do marko, cavalo?



O Marco de Santa Maria de Sendelhe (Boi Morto) Marco de Arriba e Marco de Abaixo.