Dizem provir cafre do árabe kāfir, que é dito para os que não crêem em Alá. Na sua origem era nome dos agricultores pobres que cultivavam enterrando a mão as sementes.
E temos no galego:
Cafurna, canfurna, é a cova, o antro, é a furna ou palafurna; com cafundão, canfúrnias e cafua como lugares abruptos.
Cafua, cafuga, cafuguinha ou cafuguinho é a cabana feita de terrons, teitada de palha,
gestas ou urzes, que foi usada por pastores e tamém como vivenda.
Cafualha, cafualhada são verbas despetivas para um grupo de gente, escalfurnado é o pobre.
Escreve Camões:
Ali, Cafres selvagens poderão
O que destros imigos não puderam;
E rudos paos tostados sós farão
O que arcos e pelouros não fizeram.
Ocultos os juízos de Deus são;
As gentes vans, que não nos entenderam,
Chamam-lhe fado mao, fortuna escura,
Sendo só providência de Deos pura.
Cafua em São Martinho de Bandoja (Oça dos Rios) |
Bertomil de Brates (Boimorto) e a sua Cafua.
A Cafua em São Martinho de Bra (Friol). |
Cafua em São Martinho de Moldes (Melide). |
Cafua em São Pedro de Oça (Oça dos Rios).
Cafua em São Nicolau de Cis (Oça dos Rios). Aparece como nouto casso associada a um assentamento de nome Pereiras. |
Cafua em São Martinho de Bandoja (Oça dos Rios). |
Cafua em São Tiago de Goiriz (Vilalva) e a sua relação coa briga e com a chousa complexa, similar às descritas no estudo de Baltar. |
Cafua, cafurna e as palavras dessa família, dizem derivadas do árabe كَافِر (kāfir) com diferentes significados, "granjeiro" e "infiel", não crente na religião islâmica, nem pertencente às religiões do livro".
Para esta ideia de granjeiro a etimologia mais comum liga com a palavra كَفْر (kafr), plural كُفُور (kufūr) com o significado de "cidade, vila, aldeia, subúrbio", uma palavra do século VIII que ficou nos textos.
Esta raiz está muito espalhada polo oriente:
Arameio: כַּפְרָא / ܟܰܦܪܳܐ (kap̄rā) "cidade não fortificada".
Acádio: 𒅗𒀊𒊒 (kapru) "granja, aldeia"
Hebreu: כְּפָר (kp̄ār), “aldeia”.
Fenício: (kpr / kopor) "aldeia".
Por outra parte nas línguas eslavas, o nome da vaca é крава (krava) / коро́ва (koróva) de um suposto proto-eslavo *korva, cuja origem é discutida, desde um protoindo-europeu *ḱerh₂weh₂, (cornudo de *ker- "corno", *weh "adjeivação") a confrontar com o proto-céltico *karwos "cervo" e com o lituano kárvė "vaca e o prussiano antigo curwis.
Então: temos uma palavra de suposta origem semita, cafua, a dar nome ao mesmo que as línguas semitas dão nome?
Dá para reparar que os chousos, semelham crabalizas, carbalizas, de cabras ou ovelhas, e que na língua semita, as aldeias, levam um nome semelhante à cabra, capra.
A palavra cafua, chegaria e daria os topónimos na época muçulmana?
Se for assim, polo que não aparece nas zonas onde maior tempo estivo a cultura árabiga assentada?
A palavra ao estar ligada a assentamentos gandeiros com toponimos associados tipo pereira, pedreira e outros, semelha anterior ao século VIII.
Por outra parte: cafua / cafuga em galego significa "choça", e também "soez, vil, desprezível", que com as formas parelhas gafua, bafua / vafua, mafua, dando isto uma certa antiguidade, muito mais para além de pensar que a origem estaria no contato com o árabe كافر (kāfir) "cafre", e pola muita variação da consoante inicial, (celta-p: bafua / mafua, celta-q: cafua / gafua), à vez da proximidade com cafurna, canfurna, canfúrnia, caçualha, gafualha, canfurneiro .... (Vide no escrito Calipso: Sem necessidade de buscar um étimo adaptado à família de cafuga/ canfua, a raiz *cawHu, que etimologistas encontraram para cavus e demais, explicaria as palavras deste conjunto ca(n)f-. Por exemplo cavão (-om) é um terrão, e a cafua tem as paredes feitas de cavões empilhados).
Levam a pensar que a palavra de clara origem árabe: cafre كافر (kāfir) e as galegas cafua, gafua, bafua, mafua, antes do que derivadas, teriam uma raiz comum?, que talvez ligaria o indo-europeu caverna, cave ou cavus com o semita ك ف ر (k-f-r) "cobrir, ocultar; sepultura".
Na linha germânica: a raiz *kafą, com o antigo inglês e língua ânglica escocesa caff "palha, molime seco, vegetais secos". alemão Kaff "palha, molime seco" e "aldeia isolada".
Por outra parte no inglês cub: covil, tobo, talvez de linha latina por cubiculum, do verbo cubo: descansar, deitar-se.
Outra linha é a do alemão gaffen "olhar com curiosidade" com formas medievais kaffen "olhar atentamente".
Na língua romena cuib "ninho".
No valão cahoute é uma cafua, no galês cwt.
Que aparenta com cúb gaélico, na ideia de gaiola ou capoeiro, também pequeno cercado.
No italiano cafone e cafona "camponês e camponesa" também "pessoa desajeitada, que veste fora da moda".
No asturiano cabreáu, tem a forma cafriao.
Assim pode ser percebido como godalha ou godalho também acabaram em insulto.
No francês chaffaut: estada, andaime, palco; celeiro.
Ducange compila o latim medieval cafagium: casa principal. Mas vemos que na época medieval a cafua galega nada tinha já de principal.
Também cafagium: lugar vedado, cercado dentro de um bosque.
Aqui estaria a palavra cafarrote "bodega pequena", com gafalote "compartimento de proa nas embarcações", onde é possível vermos o paralelismo entre *caf- (cafua/gafalote) e *cam- (cama/câmara/camarote).
Cafua seria pois uma prévia *cafona, *kaf-ona, muita kaf-, ou da kaf-.
Sendo kaf-/ cav-: cova na terra, covil, cercado pequeno, para derivar por pejoração e aparição de novo estrato: aldeia atrasada, pejorada, lugar isolado, coberto, cova, campo(nesa), pejoração da pessoa, "atrasada, desprezível, rude", cabana, palha, colmo, vegetal de teitar, cercado pequeno.
Confronte-se com cafarnagem "rapaziada, bando de rapazes".
Dando-lhe uma volta: todos estes significados célticos, germanos, itálicos, semitas, confluem na Cafua pastoral, na cafua inicial cova de caça do cousso, e posterior "casebre" ou assentamento humano primário sedentário ao pé de um cousso, e na cafua insulto.
Cafua como cova ou antro, faz pensar que a palavra poderia ter sido paleolítica, dada hipotética raiz partilhada com cavus: *cawHu.
Cafua /cafurna cova, que foi dar a cafua cabana.
Devido à continuidade histórica que decorreu no território da antiga Gallaecia, cafua permaneceu grafada na paisagem e na fala popular?
Expansão das Cabras no Neolítico, as datas são em anos antes da atualidade:
https://www.pnas.org/content/103/42/15375 |
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