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Ucha

 


O Romano de São Pedro de Figueira. com a forma central romboide. Topónimos pecuários relevantes como  os Martingos talvez relacionado com cavalos.
Dá para reparar no topónimo Ucha.

O lexema ucha e derivados ucheira aparece com frequência associado ao sistema de chousas, numa ideia de arca, orca.
Poderia estar aparentado com urze, urzeira, uzeira? mas 3em alguns dos casos, como neste da Ucha de São Pedro de Figueira e noutros que serão vistos mais adiante, ucheira/ uceira / uzeira aparecem numa das boquelas ou caminhos laterais da chousa.
Na fala tradicional ucheira é a boca do forno do pão, mesmo ucheiras são as jambas da boca do forno. jambas de qualquer porta ou janela.
Já no galego medieval como uscheiras, na ideia de jambas

Ucha toponímica, Ucheira relacionam-se com ucha "arca" que tem uma etimologia controversa derivada do latim medieval hutica, dando nome a arcas de pedra, orcas, dólmens.
algumas uchas toponímicas poderiam corresponder, e topograficamente pode ser confirmado, ao mesmo que o topónimo porto, portela, ou boquela confronte-se com a ucheira /ocheira / oucheira "boca do forno, jamba de porta ou janela", ou o trasmontanismo oucheira / oucheiro, "poste vertical de pedra ou madeira com buracos onde encaixam travancos que fecham uma entrada"; confronte-se com huche no francês da Picardia, Ardenas e Valônia, com o significado de porta.
Ucheira / uceira poderia também estar aparentada com o italiano uscire, com uscio "porta, entrada"que a etimologia deriva do latim exire. e de ostium.
Ucha poderia ter a ver com bucha, confronte-se com o francês bouche "boca". ucha não estaria longe do latim os , oris, ou do latim ostium. 
Se formos a uma etimologia derivativa latinista uceira / ucheira poderia vir do adjetivo ostiaria "da boca".
Por exemplo ucha em asturiano e galego tem as formas ucha e bucha (no asturiano também como gucha ḥucha).
Semelha pois que a ucha, arca, e talvez a inicialmente a ucha "peto, mealheiro" são assim chamadas pola sua boca, ranhura e não polo seu conteúdo, polo seu vácuo interno?
Na família eslava, ústa no checo e eslovaco ou уста́ (ustá) no russo e outras formas similares da família eslava ou o antigo prussiano āustā, ajudam a entender a relação;  muito mais estas formas do ucraniano вуста́ (vustá) ou polaco vaustá.
Que levariam a uma proto-forma *vusta, que condiz com o galego bucha / oucha (galego das Astúrias) / ucha e com o asturiano bucha / gucha / ḥucha / ucha.
Ou já os derivados de  buche, bucha, bucho com os significados de papo, estômago, bolsa, faldriqueira, arca...
No gaélico escocês buisean [buʃan] "boca pequena; lábio, beiço pequeno; focinho; bochecha pequena", diminutivo de bus "boca, beiço, lábio, focinho, cubo ou olho da roda".
Confronte-se com o galego buxão [bu'ʃaŋ] "boca estreita da cale no moinho de água, que dirige o jato contra as pás do rodízio".
O gaélico bus leva-nos pois a uma proto-forma *vu, que aparentemente derivou em um lexema produtivo: *vu
-kos "semelhante, pertencente à boca", com o sufixo proto-indo-europeu *-kos / *-ko.
Assim esta forma *vu seria raiz do latim os oris, e também de bucca, como evolução de *vu-ko de duas linhas divergentes inciais que acabárom no mesmo idioma, *vu com lexema derivativo que gerou também a linha eslava *vusta.
Confronte-se com o galego buxão "boca estreita da cale no moinho de água, que dirige o jato contra as pás do rodízio".
Sânscrito 
भूक (bhUka) "buraco".

Na linha germânica ucha aparentaria com out, proto-gremânico *ūta. Isto explicaria a grande quantidade de topónimos outeiros e similares que não correspondem com o lugar outo / alto, mas sim com o lugar da saída da grande chousa.
Confronte-se com ouchear "espiar, assejar" parelho de outear. Dissimilar com o espanhol otear que é mais olhar desde um outeiro, enquanto no galego outear, ou ouchear é espiar, olhar por um buraco, por uma "ucha". Onde já ucha é a reganha com conotação sexual dos seios, da vulva, das nádegas.

Outra hipótese etimológica para os topónimos Ucha e derivados seria desde o verbo latino uro e os seus particípios ustus, usta, ustum "queimado" .



Uxeira na ponta de um hipotético cousso de caça evolucionado a granja neolítica.



Outal de Medáns em Setados (nas Neves)


Assim Uxes de Santo Estevo de Morás (Arteijo) poderia ter aqui "na boca" a sua origem, também Ouces ou Outes?

Voltando a Ucheira, pode ser confrontada com Usera na Cantábria:


Usera de San Félix de Langre (Ribamontán al Mar)




Aqui a Usseira, freguesia de Óbidos:



Este é uma parte do plano cadastral da Usseira, onde é possível vermos as longas chousas paralelas que na sua zona de confluência assenta o próprio lugar da Usseira.



Assim também Santa Maria de Usseira (Cea), conhecida polo seu mosteiro e frequentemente grafada como Oseira, já Usseira em época medieval é um ponto onde a boquelas de uma grande chousa do vale do rio Mirela estaria:








Caso similar em São Martinho de Covas (Ferrol) onde a longa Chousa norte-sul tem uma saída sul com o nome da Useira diretamente sobre a praia de São Jurjo, nesta longa chousa também há uma saída lateral com o nome de Jurjeira, abrindo a hipótese de ter sido *surgeira ou mesmo *surdiaria.




Bufarda de Santa Maria de Ombre (Pontedeume), a salientar o topónimo Outeiro que está relacionado com uma saída, veja-se a vizinha Portela, antes do que um lugar alto.
Outeiro, como saída, aparenta com uceiras, ucheiras toponímicas, onde o uscire italiano teria a ver?,  com o par o protogermânico *uta, que vão sair de um protoindo-europeu *ud "exterior".

Os Sardinhas de (Sob a Serra) Soasserra (Cabanas), um sistema de chousas complexo. com um topónimo chamativo no seu lado leste no caminho lateral que tronça a chousa maior: Ucheira, como palavra patrimonial dá nome à boca do forno, às jambas de portas ou janelas, ostium, uscire (italiano), também ucha faz referência a arca, podendo ter havido uma anta, um dólmen, ou podendo dar nome na ideia de ucha/arca lugar fechado, não à porta, boquela, mas a totalidade da chousa, como lugar pechado.


Guindeiras em São Miguel de Remonde, fazendo parte do curro da Vacariça, com os microtopónimos de Uceira "saida" (uscire no italiano), Sesteira (lugar de sesteio do gando), Estivada Velha.



A Uceira de São Vicenço de Burres (Arçua), na boca de uma estrutura em cousso, como o topónimo uch- antes visto, talvez como usseira, e por thetacismo como uceira. Se quadra Uzeira, de uze /urzes?
Outro topónimo relevante: Taberna Velha, acostumando estar no beco dos coussos, ou seu perímetro imediato.
No cantar do Mio Cid, escrito em romance:
Vio puertas abiertas e uços sin cañados...
Onde a palavra uço seria derivada do latim ustium "poxigo, porta menor" no atual castelhano grafada uzo.

Trás da Oceira na freguesia de Barbeito (VilaSantar) na ideia de Uzeira aqui descrita, mas também na ideia de osso, osseira, lugar de acúmulo de óssos a semelhança dos concheiros.




A Uceira Branca em Santa Maria de castro de Rei de Lemos (Paradela), Uceira que está também ao pé de uma grande chousa hipotética, no seu caminho de saída lateral, como as anteriores observadas.





Oça Velha na freguesia de São Vreijo de Oça (Carvalho), também na mesma situação lateral como porta de um hipotético cousso antergo.





Xamanismo paleolítico na esculca etimológica




A palavra meco:
personagem legendária à quem lhe eram dadas as culpas de tudo
ente imaginário para amedrontar as crianças
dianho
remoinho de vento
máscara do entrudo tradicional em forma de cabeça de burro
boneco de entrudo que é queimado no final das celebrações
máscara de entrudo
máscara de procissão religiosa católica
arte de imitar os gestos e falas de outra pessoa
mimo, necessidade de afeto; capricho
afago, carícia
borboleta noturna
pequeno verme
médico

Junto com a palavra asturiana mecu:
nome usado entre marinheiros por tabu ou superstição para evitar nomear o padre ou cura católico
demônio






Também as expressões:
Fazer méquias e mais fazer méquis:
fazer caretas, momices, fazer movimentos, gestos, diante de una persona, por mofa, zombaria ou divertimento, com uma luz ou tição.


Da raiz proto-ondo europeia *megʰ
Siríaco clássico 
ܡܓܘܫܐ (məḡūšā) "sacerdote do zoroastrismo, mago".
Persa antigo 
𐎶𐎦𐏁 (m-gu-š /maguš/) "sacerdote do zoroastrismo".

Havendo meco com toda esta raiz proto-religiosa do xamanismo inicial, com a variação mec-/ mag- , a palavra meiga, tem fácil explicação?



Quanto aos significados de meco adjetivo como "falto de":
que está incompleto, que está falto
torto, que vê apenas por um olho
virolho, que padece estrabismo
que tem pouca visão
que tem os olhos claros
que tem os olhos pequenos
que tem laganhas nos olhos
com uma ou as duas orelhas cortadas

Mais também mecu no asturiano como adjetivo:
a falar da vaca que tem um corno para arriba e outro para abaixo; que tem um corno para abaixo
virolho, que tem estrabismo
de poucas palavas, nada comunicativo, introvertido
pouco resolutivo, incapaz, parado.

Tem no assírio:
mekû  "desleixar, ser negligente"
mēkûtu "falta , carência / necessidade , escassez".

Então é sabido que o xamã é escolhido polas suas incompletudes, polas suas carências ou defeitos físicos.

Na língua asturiana mecu tem a variante megu com os mesmo significados, acrescentando que megu e mega significam bruxo, bruxa ou ajudante de bruxa, e médico, médica.
Também no vale do Xálima de fala galaico-portuguesa arcaíca, mecu significa médico, como no galego meco.
Esta linha mecu / meco  com a ideia de médico era pensada numa crase de mé(di)co, mas a presença no asturiano do par mecu / megu "médico" junto com o feminino mega "meiga", alicerça a palavra como primária e não derivada de médico.
Este par asturiano mega e megu junto com mecu e as palavras galegas meiga e meco completam-se entre si e dão muita profundidade.

Também não é por acaso que na lenda do Meco de Ogrove, o Meco seja crego, e leve o nome de João, Jão da Meca....

Povos originários da América do Norte do leste atlântico, Semínolas, o povo Creek, os Cheroquis, realizam uma dança extática, que consiste em bater com os pés repetidamente e continuamente no chão durante horas. Esta dança está comandada por um chefe cerimonial, de nome Meko, assistido por ajudantes, um segundo no cargo: Heniha, um ajudante curandeiro: Hillis Hiya, e um porta-voz do Meko: Meko Tvlvswv.




Miko (巫女) em japonês dá nome no xintoísmo às mulheres sacerdotisas. A miko anterga era xamã, medium, profeta.

Quanto à relação do meco com o latim moechus e o grego μοιχός  (moikhós) poderia ser percebido que nestas línguas poderia ser um resto da figura xamânica?
A linha etimológica do moechus "adúltero, devasso, depravado" latino é muito curta, vai dar ao grego μοιχός  (moikhós) com o mesmo significado, e daí é feito um salto a ὀμείχω (omeíkhō) “eu mejo, do verbo mejar/mijar”. Aparentemente sem uma conexão lógica.
Dai ὀμείχω (omeíkhō) teria uma raiz proto-indo-europeia *h₃meyǵʰ: confronte-se com *megʰ.
Haveria pois uma ligação entre a micção, o mejar/mijar e o meco?
Nas culturas baseadas na Amanita muscaria, a relação entre a urina e o xamã ou padre religioso está muito presente.
A Amanita muscaria tem além do enteógeno substâncias com toxicidade. Mas a substância enteogénica é eliminada na urina sem presença de tóxicos, é por isso que em ritos xamânicos, e mesmo na Pérsia, a urina de quem comeu A. muscaria é reaproveitada por alguém hierarquicamente superior para livrar-se dos efeitos negativos do tóxico.

Podemos reparar na proximidade de μοιχός  (moikhós), com o par moico / mouco "sem um chifre, sem chifres e outros significados" ....

Rebenta-bois



O mecoro na gíria do cesteiros é o carneiro, a meca é a ovelha:

Assim mengo é nome de uma raça de ovelhas ariscas, mengo também é nome do demo, do mimoso, do queixoso.
Mengo tem por par menjo, e daí menjugo, menjengo, meijengro ....
Um lexema, conceito, antigo que gerou muito vocabulário.



Para pôr aqui a palavra valuro:
Com os significados de:
Usureiro; ambicioso
De corpo desarmónico.
Obeso.
Desleixado.
Feiticeiro, médico, sacerdote, milagreiro e profeta.
Espírito maligno, demo.




















Depois de escrever isto: soubem que o professor Higinio Martins Esteves tratou este tema no seu escrito RELIGIÃO E MITOLOGIA DOS POVOS DE LÍNGUA CÉLTICA.
Obrigado. 🙏